Por que se preocupar com a preservação da informação digital?

No dia 20 de fevereiro, será aberto o pregão eletrônico n. 1/2013, relativo ao registro de preços para serviços de recuperação de dados de quatro unidades de discos rígidos pertencentes ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) do Ministério da Cultura, danificados por oscilações de corrente elétrica ocorridas no edifício Central Brasília, sua antiga sede. Tal contratação fundamenta-se na necessidade de recuperar as unidades de discos rígidos, que possuem informações relevantes para a autarquia.

Esse problema ocorrido no IPHAN, que pode dar-se em qualquer organização, é um exemplo da necessidade do desenvolvimento de estratégias e políticas de segurança da informação e de preservação digital.

A Carta para Preservação do Patrimônio Arquivístico Digital publicada pelo Conselho Nacional de Arquivos (Conarq) em 2004, elaborada com base nas proposições e recomendações da Carta para a Preservação do Patrimônio Digital da UNESCO, de 2003, a alerta sobre o perigo iminente de desaparecimento de substanciais parcelas do legado digital da humanidade e sobre a necessidade de se estabelecer políticas, estratégias e ações que garantam a preservação de longo prazo e o acesso contínuo aos documentos arquivísticos digitais.

Curiosamente, em novembro de 2006, a mencionada Carta recebeu do IPHAN o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade na categoria Preservação de Bens Móveis e Imóveis.

A política de preservação digital preconizada na Carta consiste em garantir a manutenção de longo prazo da sequência de bits e a acessibilidade contínua e pertinente da informação digital indefinidamente, de forma a minimizarem-se os riscos associados ao caráter efêmero da informação digital, quais sejam:

  • A fragilidade intrínseca do armazenamento digital;
  • A degradação física do suporte;
  • A rápida obsolescência da tecnologia digital – hardware, software e formatos;
  • A dificuldade em garantir a autenticidade dos documentos;
  • A dificuldade em garantir a integridade dos documentos – fácil acesso;
  • A complexidade e os custos da preservação digital[1].

As estratégias para a preservação de objetos digitais devem assegurar o acesso às informações digitais sempre que necessário, a preservação da autoria das obras, a preservação física das mídias e a preservação lógica dos formatos, que são aspectos dependentes de hardware e de software.

Preservar significa que as informações serão mantidas íntegras, sem danos, perdas ou alterações, podendo ser acessadas, interpretadas e compreendidas pelo usuário, e que tais ações poderão ser realizadas em longo prazo.

As estratégias comumente adotadas para a preservação digital incluem a migração e conversão de dados, a atualização de suporte em função de upgrade de software e de hardware, a emulação e o uso de identificadores persistentes – expedientes que identificam, por nome global, único e persistente, e independente da localização, mesmo que o recurso não exista mais.

O IPHAN, mais do que qualquer outra organização, pela natureza da sua missão de preservação do patrimônio histórico e artístico nacional, tem um compromisso com a preservação da memória organizacional, que exige a implantação de sistema para reunir os documentos produzidos no exercício das suas atividades, o registro das suas experiências, o conhecimento de como fazer as coisas, a forma de abordar os problemas e questões. Esse sistema deve possibilitar ainda o reuso e o compartilhamento desse conhecimento.

Os sistemas de memória organizacional criam uma base de conhecimentos relevantes para o uso da organização em situações futuras e engloba, como principais componentes de sua arquitetura:

  • A aquisição/captura e manutenção do conhecimento – visa coletar o conhecimento disperso nas diversas fontes de informação;
  • A integração do conhecimento – visa tornar persistente, perenizar o conhecimento registrado da memória organizacional e;
  • A recuperação do conhecimento – visa fornecer conhecimento relevante aos usuários para a realização de tarefas.  

O núcleo de um sistema de informação da memória organizacional é o repositório digital. Ele integra sistemas legados, novas informações e seus metadados. Armazena documentos heterogêneos: projetos, normas, relatórios, manuais, cursos, discursos, artigos, acórdãos, processos, em diferentes suportes, textos, hipertextos, documentos, e-mails, gráficos, vídeos, imagens, entre outros.

Um repositório digital confiável utiliza metadados na identificação dos objetos digitais para o acesso, gestão e preservação de longo prazo dos documentos depositados.

Segundo Miguel Arrellano, para garantir um repositório digital confiável, dever-se-á[2]:

  • Utilizar guia para a digitalização de coleções;
  • Usar software de repositório digital;
  • Estruturar o repositório em conformidade com o Modelo Open Archive Information System – OAIS (Norma ISO 14721:2003) – Requisitos para a preservação digital;
  • Usar o Dicionário de Metadados PREMIS (esquema de metadados para a preservação);
  • Utilizar um formato padrão de metadados;
  • Utilizar um extrator padrão de metadados;
  • Aplicar uma norma de segurança da informação;
  • Realizar auditoria para certificação;
  • Participar de uma rede distribuída de preservação digital, como, por exemplo, a Portico (Digital Preservation and Electronic Archiving Service) e Lockss (http://camorim.wordpress.com/tag/preservacao-digital-distribuida);
  • Contratar arquivistas especializados em curadoria digital (seleção, preservação, manutenção, coleção e arquivamento de dados digitais e a certificação de confiabilidade e integridade do conteúdo).

Os repositórios digitais são serviços vinculados organicamente aos seus ambientes institucionais; são cumulativos e persistentes e, portanto, têm compromissos com a formação da memória organizacional, com a preservação de longo prazo dos documentos de valor permanente.

Organizações que implantam repositórios e políticas de preservação digital consistentes não estão expostas a problemas como esse, objeto do pregão eletrônico n. 1/2013 do IPHAN. A necessidade de se estabelecerem políticas institucionais de preservação digital possibilitará que as instituições brasileiras sigam o exemplo de países que comungam dessas preocupações.

A título de ilustração, pode-se citar o projeto da Autoridade de Antiguidades de Israel, que está digitalizando documentos, fotografias e mapas resultantes de escavações arqueológicas realizadas entre os anos de 1867 a 1870, com observância das normas adequadas às necessidades de pesquisadores. O projeto visa disponibilizar ao mundo informações sobre documentos encontrados em 30 mil sítios arqueológicos.

A InnovaGestão oferece cursos e realiza projetos de implantação de repositórios institucionais para a preservação da memória organizacional utilizando o DSpace, software de código open-source, desenvolvido em um projeto colaborativo do Massachusetts Institute of Technology (MIT) Libraries e a Hewlett-Packard Company (HP), voltado para o desenvolvimento de repositórios digitais que capturam, armazenam, indexam, preservam e redistribuem a informação em formato digital.  O Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) foi responsável pela tradução e disseminação do DSpace no Brasil.

Postado por Neide De Sordi

Categorias: Gestão Documental, Preservação Digital, Repositórios Digitais


[1]  CONSELHO NACIONAL DE ARQUIVOS (Brasil). Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos. Carta para a Preservação do Patrimônio Arquivístico Digital.  Rio de Janeiro: Conarq. 2004. 24 p. Disponível em: http://www.documentoseletronicos.arquivonacional.gov.br/Media/publicacoes/congresso_abarq__ctde_final.pdf

Acesso em 16/02/2013.

[2] ARRELLANO, Miguel. Repositórios Digitais Confiáveis. Trabalho apresentado no 2° Congresso Brasileiro dos Arquivos do Poder Judiciário.  Disponível em: <http://www.slideshare.net/gemireki/repositrios-digitais-confiveis >. Acesso em 10/11/2012.