As Manifestações Sociais e a Gestão do Conhecimento

 

O poder de mobilização popular articulada pelas redes sociais é uma tendência mundial, mas, no Brasil, a força desse movimento de rebeldia civil é um fato novo.  

Entre os dias 17 e 21 de junho, um milhão de pessoas foram às ruas, convocadas por meio das redes sociais, sem o aparato comumente utilizado nessas ocasiões, como carros de som, alto-falantes, apitos e faixas pré-fabricadas.

As manifestações tiveram origem em São Paulo, convocadas pelo Movimento Passe Livre (MPL), em razão do aumento das passagens de ônibus, e se expandiram para outras causas decorrentes da insatisfação popular com os serviços públicos, com a política e a corrupção.

Diferentemente dos movimentos sociais com pautas de reinvindicações e lideranças que apresentam e negociam essa pauta, as reinvindicações atuais são muito diversificadas, apresentadas em cartazes improvisados, mas focadas no processo político do país. Especificamente, foram objetos das manifestações que atingiram mais de 400 cidades brasileiras: o aumento das tarifas de ônibus, a corrupção, má gestão pública, os gastos federais com a Copa do Mundo, a PEC n.37, os 500 mil homicídios registrados nos últimos 10 anos e os conchavos políticos.  

Os manifestantes renegam a participação dos partidos políticos. Segundo pesquisa do Ibope, 89% não se sentem representados por nenhum partido ou político. Os estudiosos argumentam que se trata de uma crise de representação do modelo político brasileiro. Afirmam que não se trata de um movimento ideológico, a grande maioria é despolitizada, ou, na opinião de alguns, existe um sentimento generalizado de antipartidarismo. Essa rejeição das instituições estende-se aos sindicatos e a outros movimentos sociais consolidados.

A grande maioria dos manifestantes é pacífica. No entanto, é impossível controlar a massa. A reunião de milhares de participantes sempre será propícia à ação de vândalos, o que não compromete a legitimidade da manifestação democrática. 

Desde a redemocratização do país e da promulgada da Constituição, há 25 anos, é a primeira vez que um movimento social entrou para a agenda política e despertou a preocupação dos Governos porque é nítida a descrença e a falta de confiança nas instituições democráticas.

Na tentativa de aplacar o ímpeto popular, utilizando a sua grande popularidade, a Presidente Dilma, em pronunciamento nacional, disse que é preciso aproveitar o vigor das manifestações para que mais mudanças sejam feitas em benefício da população. No entanto, apresentou como solução projetos já conhecidos da pauta do Governo, como a extensão da Lei de Acesso à Informação aos estados e municípios; a transferência dos royalties do petróleo para a Educação; a reforma política, deixando claro que esta é coadjuvante no processo que deve ocorrer no Legislativo.

O atual cenário poderá complicar-se ainda mais, levando a uma total crise de governabilidade, com o aumento da crise econômica, representada por um PIB abaixo de 2%, pelos conflitos indígenas, pela lenta, mas progressiva diminuição do nível de emprego; aumento da inflação, da taxa de juros e início da temporada anual de  reinvindicações de reajuste de salários do funcionalismo público. 

Desse cenário pode-se perceber que a inclusão socioeconômica ocorrida na última década não foi suficiente para melhorar as condições de vida da população porque faltaram investimento em infraestrutura e mudanças estruturais.

Ao lado do fornecimento das bolsas-família, bolsas-escola, bolsas-gás e de outros programas de transferência direta de renda faltaram:  investimento em escola e hospitais de qualidade, transporte público que garanta a mobilidade, reformas políticas que resultem em representação popular mais preocupada com o representado, além de reforma dos códigos processuais que possibilite a diminuição dos recursos e o consequente bom funcionamento da Justiça.

A insatisfação popular decorre da incapacidade de o Governo, políticos e instituições promoverem a comunicação com a sociedade brasileira nesses tempos de acesso rápido à informação. Encontram-se todos perplexos com a força do movimento popular, com a sua capacidade de mobilização, sendo incapazes de prever os desdobramentos futuros dessa fenomenal participação ativa da sociedade civil.

Canais de comunicação com a sociedade civil organizada já foram estabelecidos pelo Governo, a exemplo da Parceria para o Governo Aberto (Open Government Partnership – OGP), que incluem a participação de um coletivo de organizações da sociedade civil – a fim de promover a articulação das organizações na revisão e no monitoramento do Plano Brasileiro do Governo Aberto – e elaboração de uma agenda de diálogo com o governo.

A necessidade de melhorar a comunicação entre governos, políticos e seus representados, mais do que nunca, faz-se presente. Embora as instituições e os políticos estejam nas redes sociais, ainda não conseguiram capitalizar o uso dessas mídias para melhorar a comunicação com os seus representados, especialmente os jovens, que, muitas vezes, não dominam os conteúdos complexos da comunicação institucional.

A falta de conhecimento dos cidadãos acerca das questões da Administração Pública dificulta a participação social.  Medeiros & Pereira (2003)[1] afirmam que nem mesmo as camadas mais abastadas da sociedade possuem instrumental cognitivo para compreender a máquina pública e muito menos as sistemáticas de elaboração e execução orçamentárias.

A informação e o conhecimento são transformados pela ação dos indivíduos, geram benefícios sociais e econômicos, estimulando o desenvolvimento. A Gestão do Conhecimento visa tornar as informações acessíveis. A partir do momento em que um ator compartilha uma informação, ele colabora para a transformação do conhecimento pessoal em conhecimento coletivo, transferindo seus conhecimentos para outras pessoas. As redes sociais são ferramentas da Gestão do Conhecimento porque potencializam o acesso à informação e podem ser consideradas estratégias de apoio à gestão pública.

A Gestão do Conhecimento tem como objetivo tornar as informações produzidas pelas organizações do Estado acessíveis a todos, compartilhando as melhores práticas e tecnologias, oferecendo ferramentas e metodologias para a disseminação desses conhecimentos necessários à interlocução entre o Estado, os partidos políticos e a sociedade civil.

Reinventar uma nova forma de atuação do Estado é essencial para o seu sucesso e passa pela concepção inovadora de cidadania, com a participação do cidadão na gestão pública, nos planos federal, estadual e municipal.



[1] MEDEIROS, Paulo Henrique Ramos; PEREIRA, José Matias. Controle social no Brasil: confrontando a teoria, o discurso oficial e a legislação com a prática. Revista do TCU, Brasília, n. 98, p.63-72, 01 out. 2003. Trimestral. Disponível em: http://www.anpad.org.br/evento.php?acao=trabalho&cod_edicao_subsecao=45&cod_evento _edicao=20&cod_edicao_trabalho=4928.
Acesso em 23 junho 2013.